Século XIX

Século XIX

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Wendroth: Tipos humanos característicos do Rio Grande em meados do século XIX
Após a Guerra de 1801, um novo acordo, o Tratado de Badajoz, redefiniria o traçado das fronteiras do estado entregando as Missões para Portugal, permanecendo Sacramento com a Espanha. Assim se iniciava um período de organização administrativa, social e econômica..[4] Nos poucos centros urbanos, como Porto Alegre, Rio Grande, Viamão, Pelotas e Rio Pardo, a sociedade começava a se estruturar. Um inglês, J. G. Semple Lisle, visitando Rio Grande nessa época, deixou um testemunho muito favorável sobre o bom acolhimento que teve e as maneiras prestativas do povo, cuja hospitalidade "excede tudo o que vi em outras partes do mundo. (…) Poderia encher um volume com a narração dos atos de bondade com que fomos cumulados"[9][10]. Porto Alegre tinha cerca de quatro mil habitantes e sua vida como capital começava a se definir claramente, além de crescer como força econômica, assumindo a posição de maior mercado do sul. Seu comércio se fortalecia com a atividade crescente do porto, localizado na confluência das duas principais rotas de navegação interna, e já havia espaço para a abertura da sua primeira Casa de Ópera, na verdade um barracão de pau-a-pique, mas que indicava o esboço de um interesse cultural mais sofisticado. Enquanto isso, Pelotas se firmava como maior centro da produção de charque e através dele nascia uma aristocracia urbana, embora fosse se individualizar de Rio Grande apenas em 1812, tornando-se Freguesia de São Francisco de Paula (recebendo o nome Pelotas algumas décadas depois). Em 19 de setembro de 1807 a Capitania ganhou sua autonomia e em 1809 foi elevada a Capitania Geral, composta por apenas quatro municípios: Porto Alegre, Santo Antônio da Patrulha, Rio Grande e Rio Pardo, que dividiam entre si toda a extensão do estado.[3]
A paz durou pouco. Em 1811 o estado já se via envolvido em nova disputa internacional, agora despertada pela revolução iniciada por Artigas em Buenos Aires e que pretendia unificar todos os estados do Prata. Montevidéu resistiu e pediu ajuda ao príncipe regente Dom João, e este enviou tropas gaúchas para combater, sob o comando de Dom Diogo de Souza, o chamado Exército Pacificador. Na esteira do avanço militar pelo pampa, fundaram-se cidades como Bagé e Alegrete. Retirou-se o exército pouco depois, em função da assinatura de um armistício, apenas para ser substituído em 1816 por um batalhão ainda maior vindo de Portugal, composto por veteranos das guerras européias, a fim de rechaçar a invasão das Missões por Artigas. As lutas terminaram com a anexação da Banda Oriental, o atual Uruguai, ao Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves sob o nome de Província Cisplatina, que na prática se tornou uma extensão do Rio Grande[3][4].
Em 1822, com a Independência do Brasil, a Capitania se tornou uma Província, foi constituída a primeira Assembléia eleita, e recebeu seu primeiro governante civil, José Feliciano Fernandes Pinheiro, autor também da primeira história geral do estado, os Anais da Província de São Pedro. Nesta altura a população total chegava a cerca de 90 mil almas. Pelo interior os povoados se multiplicavam, aparecendo Jaguarão, Passo Fundo, Cruz Alta, Triunfo, Taquari, Santa Maria.[3] As Missões, porém, já caíam em ruínas e apenas os velhos índios se lembravam delas, muitas vezes com saudade. Na capital viviam cerca de 12 mil pessoas. Auguste de Saint-Hilaire, visitando então, considerou-a bela, com um comércio variado, muitas oficinas e casas de dois andares, com um povo formoso e vigoroso, mas deplorou a sujeira das ruas[11]. Sobre a administração da Província sua opinião foi claramente condenatória:
"Os abusos atingiram o cúmulo, ou melhor, tudo era abuso. Os diversos poderes confundiam-se e tudo era decidido pelo dinheiro e pelos favores. O clero era a vergonha para a Igreja Católica. A magistratura, sem probidade e sem honra (…) Os empregos multiplicavam-se ao infinito, as rendas do Estado eram dissipadas pelos empregados e pelos afilhados, as tropas não recebiam seus soldos; os impostos eram ridiculamente repartidos; todos os empregados desperdiçavam os bens públicos, o despotismo dos subalternos chegou ao cúmulo, em tudo o arbítrio e a fraqueza andam a par da violência"[11].
Arquitetura alemã de enxaimel em Nova Petrópolis.
O ano de 1824 foi marcado pelo início da colonização alemã no estado, uma iniciativa do governo imperial para povoamento do sul, que visava também a dignificar o trabalho manual, formar uma classe média independente dos latifundiários, engrossar as forças de defesa do território e dinamizar o abastecimento das cidades.[5] Chegando em Porto Alegre, os imigrantes aguardavam até a definição de suas terras e a concessão de provisões iniciais. Nesta cidade grupos remanescentes deram origem ao bairro Navegantes. O grosso do contingente, porém, seguiu para a região ao norte da capital, concentrando-se em torno do rio dos Sinos, formando os núcleos iniciais de cidades como Novo Hamburgo e São Leopoldo e desbravando as matas em torno para instalação de propriedades rurais. As levas de imigrantes germânicos continuariam a chegar ao longo de todo o século XIX, totalizando mais de 40 mil indivíduos, e os centros de povoamento que eles fundaram desenvolveram economias prósperas e culturas regionais características[3].
As guerras, porém, continuavam. O estado foi a base de operações durante a Guerra Cisplatina, que eclodiu em 1825 pretendendo recuperar o território da Província Cisplatina para as Províncias Unidas do Rio da Prata, havendo escaramuças em território gaúcho e um grande confronto, a Batalha do Passo do Rosário, tida como a maior batalha campal já ocorrida no Brasil. Fructuoso Rivera chegou a reconquistar para as Províncias Unidas os Sete Povos das Missões, mas com a assinatura da Convenção Preliminar de Paz, em 1828, as Missões foram devolvidas - mas não sem antes serem pilhadas pelo exército em retirada - e o Brasil acabou por ter de entregar a Cisplatina por força do Tratado do Rio de Janeiro, que criou a República Oriental do Uruguai.[7]
REFERÊNCIAS
  1. César, Guilhermino. As Raízes Históricas. In Editora Globo (ed). Rio Grande do Sul: Terra e Povo. Porto Alegre: Globo, 1964
  2. Damasceno, Athos. Artes Plásticas no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Globo, 1970
  3. Costa, Eimar Bones da (ed). História Ilustrada do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Já Editores, 1998
  4. Quevedo, Júlio. História Compacta do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Martins Livreiro, 2003
  5. Holanda, Sérgio Buarque de (org.). História Geral da Civilização Brasileira. São Paulo/Rio de Janeiro: Editora DIFEL, 1976.
  6. Suess, Paulo. O anti-herói Sepé Tiaraju. Conselho Indigenista Missionário. 10 de fevereiro de 2006
  7. Flores, Moacyr. Guerras e conflitos no Rio Grande do Sul. Cadernos de Cultura do Memorial do Rio Grande do Sul
  8. Xavier, Paulo. A Estância. In Editora Globo (ed). Rio Grande do Sul: Terra e Povo. Porto Alegre: Globo, 1964
  9. César, Guilhermino. Primeiros Cronistas do Rio Grande do Sul: 1605-1801. Porto Alegre: EdiUFRGS, 1998
  10.  Lisle, James George Semple. The life of Major J. G. Semple Lisle: containing a faithful narrative of his alternate vicissitudes of splendor and misfortune, Piccadilly: W. Stewart, No. 194, opposite York House, 1799, 382 pp.
  11. Saint-Hilaire, Auguste de. Viagem ao Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Martins Livreiro, 2002
  12. Macedo, Francisco Riopardense de. Porto Alegre: Origem e Crescimento. Porto Alegre: Prefeitura Municipal, 1999
  13. Museu Júlio de Castilhos - um século contando a história gaúcha. Revista Museu (em português).
  14. a b Simon, Círio. Origens do Instituto de Artes da UFRGS - Etapas entre 1908-1962 e Contribuições na Constituição de Expressões de Autonomia no Sistema de Artes Visuais do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: PUC, 2003.
  15. a b c Franco, Sérgio da Costa. Guia Histórico de Porto Alegre. Porto Alegre: EdiUFRGS, 2006
  16. Corte Real, Antônio. Subsídios para a História da Música no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Movimento, 1984
  17. Cine Theatro Capitólio Memorial na página do IPHAE (em português).
  18. A história do Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense Portal Oficial do Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense.
  19. Maestri, Mário. Os Gringos Também Amam. Revista Espaço Acadêmico, nº 88, setembro de 2008
  20. Lagemann, Eugênio. O Banco Pelotense & o Sistema Financeiro Regional. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1985
  21. Eskinazi, Davit. A arquitetura da exposição comemorativa do centenário da Revolução Farroupilha de 1935 e as bases do projeto moderno no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: UFRGS, 2003
  22. Ribeiro, Cleodes. Festa e Identidade: Como se fez a Festa da Uva. Caxias do Sul: UCS, 2002.
  23. Mostra Revista do Globo 1929 - 1939. Exposição virtual. Ex-Libris (em português).
  24. Silva, Joselina da. A União dos Homens de Cor: aspectos do movimento negro dos anos 1940 e 50. Scientific Electronic Library Online
  25. História da Feira do Livro. Porto Cultura (em português).
  26. Rigatto, Mário. A Saúde. In Editora Globo (ed). Rio Grande do Sul: Terra e Povo. Porto Alegre: Globo, 1964
  27. Kremer, Alda Cardoso. Panorama da Educação. In Editora Globo (ed). Rio Grande do Sul: Terra e Povo. Porto Alegre: Globo, 1964
  28.  Medeiros, Laudelino. As cidades. In Editora Globo (ed). Rio Grande do Sul: Terra e Povo. Porto Alegre: Globo, 1964
  29. Dinges, John. Os anos do Condor. Uma década de terrorismo internacional no Cone Sul. São Paulo: Companhia das Letras, 2005. pp. 347-353
  30. Reis, Nicole Isabel dos. Deu pra Ti anos 1970 - Rede Social e Movimento Cultural em Porto Alegre sob uma Perspectiva de Memória e Geração. Iluminuras. UFRGS, 2007
  31. Santos, Gilton Carneiro dos. A Dívida dos Estados: Composição, Evolução e Concentração. Brasília: ESAF, 1998.
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